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Redes Elétricas Inteligentes (Smart Grids) e o uso da IA como suporte na operação de parques eólicos

O crescimento da capacidade instalada da energia eólica, tem ampliado o escopo da transição energética em escala global. No entanto, as diferentes características de ventos em terra e em alto mar apresentam-se como um desafio para manter a estabilidade do sistema elétrico.

Nesse contexto, o uso da Inteligência Artificial (IA) surge como uma solução para otimizar a operação das redes, permitindo gerenciar de maneira mais eficiente essa variação natural. Com isso, torna-se possível equilibrar a oferta e demanda de energia. Este artigo explora as tecnologias de IA aplicadas na operação de parques eólicos, aprimorando a gestão das redes elétricas.

O que são as Redes Elétricas Inteligentes (Smart Grids) e como Concessionárias de Energia se beneficiam?

As Redes Elétricas Inteligentes (Smart Grids) são caracterizadas como uma versão modernizada das redes elétricas tradicionais. A integração das tecnologias digitais e de comunicação avançadas junto as redes, permitem gerenciar de forma mais eficiente o transporte de energia elétrica desde uma fonte geradora (e.g. Energia Eólica Offshore) até as residências. Essa rede é chamada de inteligente porque usa sensores, medidores e sistemas de controle e automação para monitorar o fluxo de energia elétrica em tempo real, permitindo que a energia elétrica chegue até os consumidores sem maiores problemas.

As concessionárias de energia podem identificar de forma imediata a queda no fornecimento de energia e tomar as medidas necessárias em tempo real e remotamente para restabelecer o fornecimento. O uso de todos esses equipamentos é essencial para prevenir fraudes e controlar as perdas não técnicas de energia.

Outra vantagem das redes inteligentes diz respeito ao auxílio para concessionárias identificarem as características de consumo dos clientes, apoiando o planejamento do sistema, conforme a Figura 01. Com a utilização de sensores e medidores inteligentes, é possível monitorar o consumo e a geração de energia em tempo real.

Figura 01 – Gestão inteligente de rede uma rede elétrica.

Fonte: EPE, CGEE-MCT

Qual é a diferença entre a rede elétrica tradicional e a smart grid?

A principal diferença entre sistemas tradicionais e redes inteligentes está na capacidade de troca de informações em ambas as direções por meio da rede, desde as concessionárias de serviços públicos até os consumidores e vice-versa. Alguns dos principais recursos que diferenciam as redes inteligentes incluem:

  • Tecnologia: as tecnologias de IAnuvem e digitais permitem que todos os dispositivos e ativos da rede se comuniquem, oferecendo melhor controle e autorregulação.
  • Distribuição: A energia gerada por prosumidores e outras fontes de energia renováveis – como solar ou eólica – podem ter caráter de variabilidade.  Deste modo, as tecnologias de rede inteligente ajudam a coordenar, armazenar e distribuir energia dessas fontes em um fluxo estável e confiável.    

  • Geração: funções analíticas preditivas em sistemas inteligentes significam que as tensões de alta demanda podem ser previstas e distribuídas para várias usinas e subestações.
  • Sensores: sensores de IoT em toda a rede podem auxiliar a detectar riscos logo no início, redistribuindo energia para diminuir interrupções e ajudar a equilibrar cargas sem intervenção direta dos operadores.
  • Autoreparação e manutenção preditiva: Sensores também podem ser usados para detectar problemas mecânicos e fazer simples solução de problemas e reparos, notificando os técnicos somente quando necessário – antes de qualquer problema realmente quebrar.
  • Escolha do cliente: Mais fornecedores de energia, cooperativas e microgeradores podem se juntar à rede, permitindo que os consumidores tenham mais opções na forma como recebem energia.

O desafio da variabilidade na energia eólica e o uso da IA para o planejamento na operação das redes elétricas

A energia eólica é uma das principais fontes de energia renovável e sustentável, mas a sua produção é variável. Essa ruptura ocorre porque a produção de energia eólica depende diretamente da velocidade e constância dos ventos. Em dias com ventos fracos a produção de energia é reduzida, enquanto em dias com fortes rajadas de ventos pode ocorrer excesso de produção de energia (limitado a potência nominal dos aerogeradores). Esta variabilidade constitui um obstáculo à manutenção da estabilidade da rede elétrica, porque o desequilíbrio entre a oferta e a demanda pode causar congestionamento ou subutilização da infraestrutura elétrica.

Os dados disponíveis no Portal de Dados Abertos do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) demonstram que a perturbação da energia eólica é um dos principais desafios das redes elétricas modernas, conforme pode ser observado na Figura 02 que trata da geração média horária (MWmed) do subsistema nordeste no mês de 2024. Na Figura 02, fica evidente que na média de setembro/2024 no Nordeste a energia eólica possui um melhor desempenho durante a noite, enquanto nos horários em torno do 12:00 ocorreram menor despachabilidade da fonte nas redes elétricas.

Ou seja, sem previsões precisas e controles adequados, essa variabilidade pode levar a falhas de distribuição ou à necessidade de compensação de outras fontes de energia, tais como os combustíveis fósseis, o que gera um ponto de atenção em relação a sustentabilidade do sistema elétrico.

Figura 02: Geração Média Horária (MWmed) do Subsistema Nordeste no mês de 2024.

Fonte: Portal de Dados Abertos do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

Nesse sentido, a previsão da geração de energia eólica é essencial para o planejamento da operação e, consequentemente, uma melhor estabilidade das redes de transmissão e distribuição de energia. A IA desempenha o papel de prever a geração de energia eólica com base em dados meteorológicos que são medidos pelos anemômetros situados nos parques de geração. Dentro desse contexto, existem diversas técnicas conhecidas como Machine Learning (“Aprendizado de Máquina”) em que, diversos algoritmos são utilizados para analisar uma quantidade massiva de dados meteorológicos, tais como: velocidade do vento, direção do vento, pressão atmosférica, temperatura e umidade do ar com o objetivo de se prever a geração de energia elétrica.

O estudo “Predicting Energy Generation in Large Wind Farms: A Data-Driven Study with Open Data and Machine Learning” publicado na revista Inventions (MDPI) em 2023, demonstra que diferentes algoritmos de aprendizado de máquina e aprendizagem profunda possuem altas taxas de precisão na previsão da produção de energia eólica.

•             Redes Neurais Artificiais (LSTM): 2,63% de erro na média de 30 dias de previsão à frente.

•             Aumento Extremo de Gradiente: 3,55% de erro na média de 30 dias de previsão à frente.

•             Árvores de Decisão via Floresta Aleatória: 9,70% de erro na média de 30 dias de previsão à frente.

Essas técnicas são eficazes, pois podem detectar padrões complexos e não lineares nos dados, resultando em previsões mais precisas do que modelagem estatística tradicional. Ao prever com precisão a quantidade de energia que será gerada, as transmissoras adquirem o conhecimento do que é provável de acontecer no futuro e, por esse motivo, podem realizar ajustes na operação em tempo real de forma a garantir que a oferta esteja alinhada com a demanda, reduzindo a necessidade de compensações e minimizando perdas.

Self-Healing e o Sistema Elétrico de Distribuição de Energia

                Outra abordagem que serve de auxílio para garantir a segurança no suprimento de energia elétrica são os sistemas de self-healing. Tais sistemas são utilizados para a recomposição automática de possíveis falhas nos próprios sistemas elétricos de distribuição de energia. Basicamente, o seaf-healing permite com que ocorra uma auto recomposição de possíveis ocorrências sem que haja necessidade da atuação do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

                Em um caso hipotético, por exemplo, da ocorrência da queda de uma árvore sobre a fiação elétrica os sistemas de self-healing identificam a falha, isolam e usam mecanismos automáticos com conceitos de Sistemas Elétricos de Potência para reparar a falha e garantir a qualidade na entrega de energia por parte das distribuidoras. Ou seja, o sistema é restabelecido de forma praticamente instantânea sem a necessidade de atuação humana.

                No caso da Figura 03 abaixo, suponhamos que é identificada uma falha na linha de distribuição das Casas 1 a 6. Automaticamente, o sistema de self-healing permite com que as chaves Ch1 e Ch2 fiquem abertas e, portanto, ocorre a não entrega de energia elétrica somente nesse trecho. Dessa forma, evita-se com que seja necessário desligar todo o resto da linha de distribuição até que o sistema seja reparado pela distribuidora.

Figura 03: Desligamento Automático das Casas 1 a 6, por meio do Sistema de Seaf-Healing.

Fonte: LAMBIASE em 2022.

Esses sistemas são fundamentais para garantir a entrega de energia com índices cada vez melhores de DEC (duração média em horas das interrupções) e FEC (duração em frequência média das interrupções) pelas distribuidoras e, consequentemente, trazem maior confiabilidade, resiliência e segurança as redes elétricas inteligentes.

IA e Energia Renovável: Um Futuro Sustentável

À medida que a procura por energia limpa cresce em todo o mundo, a necessidade de otimizar a produção e distribuição de energia renovável torna-se cada vez mais importante. Diversas soluções de IA oferecem soluções robustas para este desafio, permitindo a integração eficiente de múltiplas fontes de energia renováveis, fornecendo previsões precisas e otimizando a infraestrutura energética.

De acordo com o relatório “Harnessing Artificial Intelligence to Accelerate the Energy Transition” publicado pela World Economic Forum e em parceria com a Bloomberg New Energy Finance, IA será uma ferramenta indispensável para garantir a transição para um sistema de energia 100% renovável nos próximos 25 anos. Os sistemas de IA podem corroborar com a redução das emissões de gases do efeito de estufa, minimizar os custos operacionais, além de permitir maior previsibilidade e segurança para o fornecimento de energia.

Com as inovações supracitadas, a energia eólica offshore e outros recursos renováveis podem desempenhar um papel central na luta contra as mudanças climáticas, ao passo que incorporam soluções de IA e integração em seus sistemas elétricos regionais. A inteligência artificial está sendo utilizada para a previsibilidade do despacho de energia elétrica e, consequentemente, para um controle mais preciso das redes de energia. Desde a previsão precisa da produção até a otimização da distribuição e ao controle remoto, a IA poderá fornecer soluções inovadoras para os desafios colocados pela interrupção da energia eólica.

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